quarta-feira, 6 de junho de 2012

Gênero Memórias Literárias - O retrato


O retrato

Mario Morais

                Corria o ano de 1988, nas lembranças da minha infância querida que os anos  não trazem nunca mais, um fato me marcou profundamente. Naquela pequena cidade, de ruas esburacadas, de luzes a lamparina, com choupanas de chão batido, de paredes de pau-a-pique, a casa do fotografo, no final da rua principal, parecia reluzir com mais esplendor, pois era muito visitada.
         Era manhã clara e alegre de domingo quando meu avô me convidou para, juntos,  buscarmos sua encomenda lá na casa do senhor Durvalino, o fotógrafo. Sempre tive curiosidade de conhecer o interior da residência daquele fotógrafo.  O momento chegara no bojo do tempo.
         Fiquei encantado com os quadros sobre as paredes, com os porta-retratos, com os binóculos. No entanto, um quadro me chamou mais à atenção pelo seu brilho intenso. Meu avô me disse que aquele quadro retratando a família do fotógrafo fora pintado há muito tempo. O fotógrafo, observando minha admiração pelo quadro, não se contendo, passou-me a discorrer a história do retrato.
         Como não havia máquina fotográfica como esta, meu pai encomendou este quadro ao pintor de artes visuais daquela pequena cidade onde vivia, dizia Durvalino. Enquanto isso, a minha mente divagava pelas linhas em espiral do pincel.
         O fotógrafo continuou discorrendo, com o avanço tecnológico aos poucos a fotografia em tela foi sendo substituída pela máquina fotográfica explosiva com imagens em preto e branco. Agora as coisas já melhoraram, pois eu trabalho com uma máquina fotográfica mecânica, utilizando apenas bobinas de filmes. A fotografia ficou mais viva e colorida.
         Meu avô, conhecedor do tempo passado, concordava com um sinal positivo com sua sabedoria. Na sequência, fui surpreendido com a voz sábia e como que profética daquele velho ancião de rupestre aparência: Num futuro próximo esta máquina mecânica será substituída por outra mais versátil e de funções variadas. 
         Voltamos à casa do meu avô, a manhã brilhava com mais fulgor, meus olhos vislumbraram o passado, o presente e o futuro num só momento. Percebo, hoje, o cumprimento daquela voz visionária. Naquele tempo poucos tinham acesso à máquina fotográfica, nos nossos dias, surgiram as máquinas digitais, sem bobinas, apenas baterias e cartões de memórias e tem se espalhado por todas as camadas da sociedade.
         Os álbuns e quadros fotográficos estão sendo substituídos pelos retratos postados nas redes sociais da web, nas memórias dos laptops. A vida vai passando, o tempo vai mudando a forma de registrar o presente que será passado, mas não poderá mudar a importância do retrato.

Palmas, 30 de maio de 2012.

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