A
máquina
Mario Morais
O sítio do avô Olindo ficava
no Jacaré Grande, um lugar muito bonito e o melhor de tudo é que distava da
minha cidade, a Palestina do Pará, algumas horas de barco pelo rio Araguaia.
Era início da década de 90, as
embarcações iam quase a pique, cheias de gente, de bicho, de coisas variadas. Nas
idas para lá, gostava de contemplar as margens do rio com seus encantamentos:
tartarugas sobre galhos secos parcialmente submersos nas águas; gaivotas e
pelicanos revoando as praias no meio do Araguaia; nas ribanceiras, crianças
mergulhando nas águas cristalinas e profundas; ribeirinhos, na luta pela
sobrevivência, pescando mandis, pacus, piaus e piranhas.
Para minha tristeza, certo dia tudo mudou.
As minhas viagens nas férias para lá seriam interrompidas para sempre. Um
sentimento imorredouro, dum saudosismo inquietante, invadia a minha alma todos
os dias. Estávamos sentados próximo do curral daquela terra maravilhosa - onde
tudo que se plantava, dava - quando se aproximou o senhor Cassimiro e de
supetão nos informou que as margens do rio iriam subir com a construção da
Barragem Santa Isabel. A área teria que ser evacuada rapidamente. Chorei a dia
inteiro, amava aquele sítio, o barraco de paredes de barro; o fogão a lenha; as
abóboras assadas na brasa; o canto do galo; o berro do bezerro, o leite quente
do ubre da vaca.
Vovô retornou à cidade, que noutro
tempo as ruas noturnas eram iluminadas pela lua, as casas eram de palhas e os
fogões a lenha. Agora, ele não sabia viver com recursos modernos diferentes dos
campestres. A vida dele só piorava dia após dia, sobretudo quando a máquina
chegou à cidade. Teve gente que levou um susto, teve gente que tremeu de medo.
E gente soltando rojões.
Meu avô só definhava. Chovia naquela
madrugada, águas da chuva invadiram as ruas, como uma onda, também invadiram a
alma do avô Olindo. Saiu sem que ninguém reparasse, num relance derradeiro
avistou a máquina, maior decepção lhe causou. Desceu às margens do Araguaia,
deu um mergulho profundo – rio abaixo, rio afora, rio adentro, o rio. Deixou
apenas saudades e não foi visto por mais ninguém.
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